Número supera a quantidade de captação em 2022 no mesmo período
O Hospital de Urgências de Sergipe Governador João Alves Filho (Huse) realizou, na manhã desta quinta-feira, 25, a nona captação múltipla de órgãos em Sergipe em 2023. No procedimento, foram retirados coração, fígado, rins (direito e esquerdo) e córneas de uma paciente de 28 anos, natural do município de Itabaiana, vítima de Acidente Vascular Cerebral (AVC) hemorrágico. De acordo com a Organização de Procura de Órgãos de Sergipe (OPO), o número é superior ao registrado no mesmo período, em 2022, quando foram contabilizadas sete captações.
Oriunda do Hospital Regional de Itabaiana, onde recebeu o primeiro atendimento, a paciente deu entrada pela Ala Vermelha do Huse com diagnóstico de AVC hemorrágico no último sábado, 20, constatado após a realização de exame de imagem. Segundo o irmão da paciente, Henrique Chagas, tudo começou após a vítima apresentar fortes dores de cabeça e vômito ainda quando estava em sua residência.
“No último sábado, estava em casa, quando recebi uma ligação da minha irmã reclamando de muita dor de cabeça e vômito. Ao chegar em sua residência, encontrei ela deitada no chão e prontamente a coloquei em meu carro e segui para o Hospital de Itabaiana. Ainda durante o trajeto, percebi que ela tinha desmaiado. Chegando lá, ela fez uma tomografia, que constatou um sangramento no cérebro. Diante do quadro de saúde, ela foi trazida para o Huse, já que é considerado um hospital de referência. Mas, infelizmente, durante esses dias, ela acabou não respondendo ao tratamento e evoluiu a óbito”, disse o irmão da vítima.
Segundo a coordenadora da OPO Sergipe, Darcyana Lisboa, após a confirmação da morte encefálica, os familiares da vítima foram acionados para informar sobre o ocorrido, momento em que eles manifestaram o desejo pela doação dos órgãos.
“A partir dessa informação sobre a vontade de doar, a nossa equipe iniciou contato com a Central Estadual de Transplantes (CTE), que imediatamente contatou a Central Nacional de Transplantes (CNT), responsável por ofertar os órgãos no Sistema Nacional de Transplantes. Em seguida, foi acionada a equipe médica que efetuou a cirurgia de captação dos órgãos”, destaca Dacyana Lisboa.
Além da equipe médica da OPO Sergipe e do Huse, também participaram do procedimento dois cirurgiões cardiovasculares que vieram do estado de Pernambuco, especificamente, para fazer a captação do coração. “Assim que retirado, o órgão foi levado para o aeroporto de Aracaju e transportado para o estado pernambucano por meio de um avião da Força Aérea Brasileira (FAB), onde já se encontrava um paciente pronto para ser transplantado”, salienta Darcyana Lisboa.
Para realizar o transporte dos órgãos até o aeroporto, foi acionado o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu 192 Sergipe). Segundo a coordenadora da Central de Regulação do Samu 192 Sergipe, Andrea Bastos, a agilidade durante o processo é primordial para que tudo ocorra bem. “Cada minuto é precioso quando falamos de doação de órgãos, principalmente quando precisamos realizar o translado. Então, assim que recebemos o chamado, reunimos a equipe que ficou de prontidão até que o procedimento de retirada fosse finalizado”, explicou.
Como o coração, outros órgãos captados seguiram para estados do Nordeste e Sudeste. Conforme indicação da Central Nacional de Transplantes (CNT), unidade responsável por ofertar os órgãos ao Sistema Nacional de Transplantes, o fígado e rim direito seguiram para o Ceará e o rim esquerdo para o estado de Minas Gerais. Já as córneas seguiram para o Banco de Olhos de Sergipe.
Protocolo de captação
De acordo com a coordenadora da OPO, o processo de doação dos órgãos inicia ainda com o paciente em vida, mas quando já apresenta indícios de morte encefálica. Para a obtenção desse diagnóstico, é necessário que o paciente seja submetido a avaliações, testes e exames para o fechamento do protocolo, que consiste em três etapas.
“Todo processo de doação inicia a partir do momento em que a equipe médica percebe que o paciente não está respondendo ao tratamento. Daí, começa a investigação para averiguar se o paciente está diante de um quadro de morte cerebral, que é constatado por meio de três momentos. Primeiro, é feita a verificação por meio de exames clínicos. Logo em seguida, é realizado o teste de apneia. Por fim, a última etapa consiste no exame de imagem (DTC), para que seja fechado o protocolo de morte encefálica (Gasglow 3). Somente a partir dessa confirmação, entramos em contato com a família para saber se a captação está autorizada. Tendo uma resposta positiva, acionamos a Central Estadual de Transplante, que comunicará a Central Nacional e, a partir daí, é iniciado todo processo de doação”, explica a coordenadora da OPO Sergipe.
Ato de amor
De acordo com a coordenadora da OPO Sergipe, a captação só foi possível após autorização dos familiares, que decidiram pela doação dos órgãos após a confirmação da morte encefálica da jovem. Segundo ela, ações como essa são consideradas ato de amor ao próximo.
“Mesmo diante de uma situação de luto causada pela perda repentina do ente querido, familiares, em um gesto de enorme gratidão e amor ao próximo, decidiram pela doação dos órgãos, por dar uma sobrevida a quem precisa. Por isso, fica aqui o enorme agradecimento de toda a nossa equipe por esse ato de amor, de compaixão com o semelhante”, agradeceu Darcyana Lisboa.
Para o irmão da vítima, a decisão pela doação foi tomada pelos familiares como forma de validação das atitudes da paciente ainda em vida, que sempre manifestava a vontade de ajudar ao próximo. “Minha irmã era uma pessoa que espalhava alegria por onde passava. Ela gostava muito de ajudar as pessoas, a quem precisava, e hoje eu tenho certeza que ela ficaria muito feliz por estar salvando outras vidas que receberão uma parte dela”, enfatizou Henrique Chagas.
A coordenadora Andrea Bastos ainda ressaltou que o ato de doação de órgãos é uma prova de extremo amor, pois a família, mesmo diante da dor da perda do seu ente familiar, é capaz de pensar no próximo dando oportunidade de vida a um desconhecido. “Eu como servidora, fico agradecida por participar desse ciclo de amor, sendo o Samu 192 Sergipe, a ponte para que esse transporte ocorra com o cuidado e tempo hábil para que esses órgãos cheguem ao destino”, disse.
Como ser doador
Para que o paciente seja considerado doador, é necessário que ele expresse, ainda em vida, essa vontade para os seus familiares. Sobre isso, a coordenadora da OPO Sergipe orienta: “é importante destacar que, embora algumas pessoas tenham documentado esse desejo em sua carteira de identidade (RG), hoje, para doação, isso não é considerado válido. Quem autoriza a captação é a própria família, seguindo orientações da própria Lei nº 9.434, que trata sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento. Por isso, é importante que a pessoa comunique sempre aos seus entes sobre o desejo de ser um doador, seja de forma escrita ou até mesmo verbal”.
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